Da redução de salário em Virtude de Força Maior: MP 927/2020

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7 de abril de 2020
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A entrada em vigor do Decreto Legislativo nº 6, de 20/03/2020, e da Lei nº 13.979, de 06/02/2020, ocasionou a necessidade de se estabelecer medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública e da emergência de saúde pública de importância internacional, decorrentes de motivo de força maior – pandemia do coronavírus.

Nesse diapasão, foi editada a MP 927/2020 com força de lei, no intuito de se estabelecer regras, condições emergenciais e transitórias nas relações de emprego.

Através da análise da MP 927 nota-se que a intenção clara do governo, como não poderia deixar de ser, foi a “preservação do emprego e da renda”, repita-se, em virtude de força maior, nos termos do disposto no art. 501 da CLT.

Todavia, aspecto de fundamental importância – a possibilidade de redução do salário, que é objeto da presente nota – não foi tratada pela MP 927.

O art. 503 da CLT prevê a possibilidade da redução dos salários dos empregados em até 25%, respeitado o salário mínimo, porém esse dispositivo esbarra em norma hierarquicamente superior, qual seja, a Constituição da República, onde o art. 7º, inciso VI, somente permite a redução salarial se houver negociação coletiva e redução proporcional da jornada e garantia de emprego pelo prazo de vigência da negociação (novidade trazida no art. 611-A, parágrafo 3º, da CLT com a reforma trabalhista).

Desta forma, em tese, para reduzir o salário, sem riscos de incremento do passivo trabalhista, a empresa precisaria se submeter a uma negociação coletiva, o que, nos dias atuais, beira a impossibilidade, dado o momento de confinamento a que todos estão submetidos.

Se a conjugação dos fatores redução salarial, redução proporcional de jornada e garantia provisória de emprego ao mesmo tempo não for possível, entende-se ainda viável reduzir o salário com a redução proporcional da jornada mantido o valor do salário-hora, assegurando ao empregador, em virtude de força maior, alguma segurança jurídica em futuras ações trabalhistas, onde poderão sustentar a ausência de prejuízo ao empregado.

A manutenção do negócio empresarial é medida que se impõe e conta com o interesse de todos, sendo que a redução unilateral do salário tem por escopo preservar o bem maior do trabalhador, qual seja, o seu emprego.

Daí a necessidade dos intérpretes jurídicos flexibilizarem a aplicação da legislação na forma que melhor atenda aos anseios da sociedade, sobretudo considerando a incidência de força maior.

Nesse cenário, dar sustentação ao acordo individual para reduzir o salário, observando a redução proporcional da jornada e a garantia provisória do emprego são medidas legais que devem ser consideradas.

Entendemos, ainda, que toda ação do empregador que importe assegurar ao empregado um mínimo de subsistência e dignidade denota um condão humanitário por parte da empresa, que certamente será considerado pelas instâncias julgadoras da Justiça do Trabalho.

Não se pode perder de vista que dentre os direitos fundamentais do cidadão está o seu emprego, que antecede até mesmo o seu salário.

Preservando-se o negócio, o emprego e o salário estarão salvaguardados, atendendo-se, por conseguinte, os interesses do empregador e do empregado, da sociedade em geral.

Em outras palavras, o objetivo da diminuição salarial, sempre acompanhada da redução proporcional da jornada, deve ser a de preservar empregos e evitar demissões decorrentes de fatores que vão além da previsão do empregador.

Importante, por fim, ressaltar que a redução de salário precisa ser geral, ou seja, todos os trabalhadores da empresa devem ter seus salários reduzidos.

Reduzir o salário, seja aplicando a previsão expressa do artigo 503, da CLT, seja associando a uma correspondente redução da jornada de trabalho – mantendo-se, nessa última hipótese, o valor do salário-hora , são opções que se encaixam na grave realidade em que o país está passando, possibilitando a preservação do negócio, do emprego e do salário.